Cipozal

Facão - Créditos Marcelo Braga no Flickr (@elbragon)

Escrevo no meu dialeto centro-mineiro, aqui acrescentamos o "z" ao formal cipoal. Significado é dois: mata fechada difícil de adentrar e de inverso sair; ou figura para situação intricada, difícil de resolver. A primeira vez que adentrei capoeira assim, foi por marcação de terra com piquete de GPS, vara RTK. Você pensa no preço da terra e entra em cada lugar para achar divisão de direito, porque caridade só dedico à igreja e aos miseráveis debaixo das marquises da capital. Cerca que faço, erijo no prumo do milímetro de minha terra e com quatro arames, dois o vizinho paga. É um "cuidar do que é meu" exagerado, destrutivo. Produto do individualismo e falta de propósito dois quais vítima sou e que amaldiçoou para todo sempre em textos periódicos. 

Sair e resolver, são uma coisa só com sentido para frente. Cercado de cipós, espinhos, galhos quebrados e folhas caídas, de mãos limpas o recurso é fechar os olhos e sair fazendo força como doido, dando cabeçada e braçada até frouxar. Depois de frouxo, talvez tenha sorte de sair do cipoal. Incerteza é o sair, certeza só o frouxar. Por isso que aprendi a adentrar cipoais com ferramenta na mão, facão. Nunca caí de acidente num cipoal, mas se caísse iria quebrar um galho verde e usá-lo de ferramenta. Me viro.

Quem me dera poder adentrar situações intricadas, tendo em mãos ferramenta de força e escapatória como um facão ou sua projeção figurativa. Nesses cipoais sociais, sempre caí de acidente. Acaso do destino.

Assim é este ano da Covid, o terrível março a março. É um "cipozal", onde tudo o que se tenta só gera cansaço, o mexer sem sair do lugar. Às vezes até anda-se para trás. Refiro-me principalmente à política, mas também falo da sociedade em geral e algumas poucas vezes do interior do ser. Assuntos aparentemente díspares, mas cujas interconexões formam tudo aquilo que designamos por humanidade.

Tenho lido muito, escrito dobrado. Em tempos de internet e do Google, faço como todos e só leio aquilo que reforça meus próprios pensamentos. A muito tempo que venho questionando o mundo a meu redor e como as coisas não fazem sentido, mesmo que continuem a prosperar. Leio Pondé, Marco Villa, Bruno Manso, de Bolle, The Piauí Herald e The Economist. Vejo Vice News e Adam Curtis (acho que o Pondé também andou assistindo este último, apesar dele não ser russo). 

O muito conhecimento que adquiri, só me fez ver mais cipós à frente. Facão nenhum me ofereceram. Escritores ordinários, carrascos da ingenuidade e do sossego alheio. Leio, vejo, estudo e não identifico uma saída para este cipoal que me sugou por força de vírus importados de aviões e crenças políticas trazidas por fritadores de hamburgers e vendedores de chocolate. 

Cansado de dar braçada e já quase frouxo, resolvi quebrar um galho forte que descobri e usá-lo como ferramenta. Com tal pedaço de madeira, ferramenta a meu alcance, vou dar porrada até sair deste cipoal ou até quebrá-lo. Quebrando, arrumo outro galho e continuo a me mexer. 

Só fica parado quem não consegue imaginar o pasto aberto que há para além desta mata fechada, ou quem está morto.

É sobre como sair dessa grave crise social e econômica, este cipoal que nos encontramos dentro, que escreverei a maior parte dos textos futuros. Acompanhe-me. 


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